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AVISO (12/03/23):
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miércoles, 20 de diciembre de 2023

ARGENTINA: O Procurador-Geral Conte Grand decidiu que "o veredicto de não culpabilidade do júri é irrecorrível" e que a absolvição no caso do Camping El Durazno deve ser mantida

  

Procurador-Gral Julio Conte Grand

Em um parecer que entrará para a história sobre o tribunal do júri na Argentina e na América Latina, o Procurador-Geral da Suprema Corte de Justiça da província de Buenos Aires (SCJPBA), Julio Conte Grand, deu seu parecer no caso de alto nível do Camping El Durazno.

O brilhante parecer escrito em doze páginas faz com duras críticas à decisão da Câmara III do Tribunal de Cassação, que ele descreve como "arbitrária" e "um desvio flagrante da lei".


"Razão assiste aos recorrentes pois, por um lado, atribui-se à norma adjetiva um alcance dos fatos que ela não tem e, por outro, seguindo a partir disso, infere um raciocínio arbitrário que desqualifica o acórdão recorrido como ato jurisdicional válido", disse o Procurador Conte Grand.


Ao final, exige que o recurso dos advogados de defesa seja acolhido, que o acórdão impugnado seja anulado e que as absolvições decididas pelos jurados sejam confirmadas, uma vez que a parte prejudicada não tem legitimidade para recorrer ante um veredicto de não culpabilidade proferido pelo tribunal do júri.

Tudo o que resta agora é que a SCJPBA profira a sentença.



O parecer da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) é de altíssimo nível e se alinha com um dos pronunciamentos mais memoráveis que nosso Direito produziu em relação à garantia do non bis in idem, tal como foi o parecer do Procurador-Geral da República em 1975 no caso intitulado "María Estela Martínez de Perón Incidente de excepción de cosa juzgada (opuesto en C. n° 3150/75) S.C.C. 548, l. XVII".

Mesmo com juízes técnicos, esta foi a opinião da PGR no período de 1974-1977: "A opinião da doutrina, tanto processual como constitucional, é unânime no sentido de que o chamado efeito material da coisa julgada se baseia no respeito ao indivíduo que já sofreu persecução por parte do Estado contra a repetição do exercício da pretensão punitiva, quando o resultado do primeiro processo tenha sido insatisfatório" (ver Parec er completo PG 1974-77)



O Procurador-Geral considera o acórdão arbitrário por se afastar manifestamente da letra da lei expressa no artigo 371 quater inciso 7 do CPP (que impede que um veredicto de não culpabilidade seja declarado nulo) e da doutrina jurídica da SCJPBA e do próprio Tribunal de Cassação sobre as limitações recursivas da acusação pública e privada no tribunal do júri.

Não apenas isso, mas também derrubou o principal argumento no qual se baseou a polêmica nulidade decretada pelos juízes Violini e Borinsky da Câmara III.

Naquela ocasião, a Câmara III decretou de ofício a "nulidade de ordem pública" do debate porque o juiz de primeira instância, Fabián Riquert, havia supostamente negado à assistente de escuta especializada de intervir na declaração da menor nos debates orais.

A Câmara III considerou que isso havia sido "uma clara violação dos direitos reconhecidos à jovem vítima de contar com a assistência especializada estabelecida nas normativas, além da violação do devido processo o que, necessariamente, leva à nulidade do julgamento" (ver)

O Procurador fez um questionamento especial a essa manobra. Com a simples comparação do vídeo do julgamento, ele argumentou que "a assistente especializada na escuta de menores havia participado do debate e estava presente quando a vítima menor deu seu depoimento".

DOWNLOAD DO PARECER DA PGE TRADUZIDO AO PORTUGUÊS

(aqui)

As defesas recorreram à SCJPBA e obtiveram o apoio maciço em amicus curiae das principais personalidades e organizações jurídicas da Argentina  (download do amicus curiae aqui).

A Defensoria Pública da província de Buenos Aires e os juízes do mundialmente famoso Julgamento das Juntas Militares de 1985, León Arslanian, Guillermo Ledesma, Jorge Valerga Aráoz e Ricardo Gil Lavedra, também se juntaram ao amicus curiae e reforçaram o caráter de coisa julgada material dos veredictos de absolutórios do júri  (ver).


Juízes Guillermo Ledesma, Ricardo Gil Lavedra,
León Arslanian y Jorge Valerga Aráoz

"A decisão do júri de negar a permissão política para aplicar o poder penal não pode ser modificada por ninguém, e considero que isso não implica uma desigualdade entre as partes do processo, já que as situações entre as partes envolvidas no caso -acusado e vítima- não são equivalentes", disse o Procurador-Geral em uma das passagens mais destacadas de seu parecer.


HISTÓRICO DO CASO

O caso está em fase de análise pela Suprema Corte de Buenos Aires para resolver os recursos que foram apresentados pelas defesas dos três jovens (Lucas Pitman, Tomás Jaime e Juan Cruz Villalba) depois que, no final de 2021, a Câmara III do Tribunal de Cassação, desobedecendo a jurisprudência de seu próprio Tribunal e da Suprema Corte, decidiu anular a absolvição do júri e ordenar a realização de um novo julgamento.

Foi nesse contexto que o Procurador-Geral Julio Conte Grand emitiu seu parecer, no qual afirmou que a Suprema Corte deveria dar provimento aos recursos apresentados pelas defesas, liderada pelos advogados Martín Bernat e Noelia Agüero, anular o acórdão da Cassação e, assim, confirmar a absolvição dos três jovens conforme decidido pelos jurados.




PRINCIPAIS ARGUMENTOS DO PARECER

O principal argumento de Conte Grand foi que as normas que regem os julgamentos populares estabelecem que o assistente de acusação - ou seja, o representante da vítima ou sua família - não tem legitimidade para apelar de um veredicto absolutório proferido pelo tribunal do júri.

"É evidente que a Corte de Cassação se afastou da doutrina jurídica sobre o assunto", ressaltou o procurador-geral em seu parecer.

Trechos importantes do parecer:


# é flagrante o desvio da decisão do tribunal revisor em relação ao direito material (art. 371, quater, inciso 7 do CPP - artigo incorporado pela lei 14.543-) e sua doutrina jurídica, o que faz com que não só seja cabível o presente recurso por descumprimento específico da norma, mas também por ser o acórdão impugnado um pronunciamento arbitrário.


# a interpretação a ser dada à norma não é, em si, uma opinião contrária à decisão do Tribunal de Cassação, mas, sim, que tanto a norma adjetiva quanto a doutrina sobre o assunto são claras e determinantes e, portanto, a decisão é manifestamente arbitrária.


# um veredicto absolutório é irrecorrível e, em qualquer caso, a base para contestação existe exclusivamente como uma garantia a favor da pessoa condenada.


# O artigo 371 quater inc 7° do CPP estabelece que a única forma de o juiz declarar uma nulidade é quando um veredicto condenatório for manifestamente contrário à prova dos autos.


# se o legislador quisesse que a mesma regra fosse aplicada em relação a um veredicto absolutório, deveria tê-lo especificado com a incorporação desse artigo quando o Código Processual foi reformado pela Lei 14.543.


# não se deve esquecer que, de acordo com a CSJN, a primeira fonte de exegese da lei é sua letra, de modo que, quando ela não requer um esforço de interpretação, deve ser aplicada diretamente.


# Além disso, a interpretação é consistente com a doutrina jurídica desta Suprema Corte, na medida em que ela se pronunciou sobre o alcance da legitimidade do ofendido para recorrer contra um veredicto de não culpabilidade do júri popular.


# o fato de o representante privado da vítima não ter legitimidade para contestar o veredicto de não culpabilidade proferido pelo júri, não gera um dano irreparável e essa limitação não afeta as garantias constitucionais ou convencionais.


# Da tutela judicial efetiva convencional da vítima não parece derivar um direito de raiz constitucional de ter revisados os veredictos absolutórios emitidos pelo júri popular.


# as normas processuais locais que concedem à vítima a possibilidade de se tornar parte e de intervir no julgamento respeitam adequadamente a garantia do artigo 8.1 da CADH, não podendo a norma processual local que estabelece a irrecorribilidade do veredicto absolutório ditado por um júri popular ser considerada incompatível com as garantias convencionais.


# É oportuno lembrar o caráter soberano da decisão do júri popular, pois essa é a razão de ser da irrecorribilidade de seu veredicto, reconhecido pacificamente há séculos nas mais sólidas democracias ocidentais do common law.


# A decisão do júri de negar a permissão política para aplicar o poder penal não pode ser alterada por ninguém e considero que isso não implica em desigualdade entre as partes no processo, uma vez que as situações entre as partes envolvidas no caso (acusado e ofendido) não são equivalentes.


Ler mais notícias aqui:

- Diario La Capital (6/12/23): "Camping El Durazno: jueces del juicio a las Juntas cuestionan que se realice un nuevo debate" (ver)

Qué Digital (19/12/23): "Abuso en el camping de Miramar: el procurador pidió revocar la anulación del juicio" (ver)

- 0223 (19/12/23): "Abuso en el camping: el Procurador General pidió anular el fallo que revocó la absolución" (ver)

- Ahora Mar del Plata (19/12/23): "Abuso en el camping El Durazno: la absolución y el rechazo a un nuevo juicio, cada vez más cerca" (ver)

- 0223 (20/12/23): "Abuso en el camping: para los defensores el dictamen del Procurador es “contundente” (ver)

- Diario La Capital (20/12/23): "Camping El Durazno: el procurador pide anular el fallo que revocó la absolución de los jóvenes" (ver)

- Palabras del Derecho (21/12/23): "Juicio por Jurados: el particular damnificado no puede recurrir el veredicto de no culpabilidad" (ver)